segunda-feira, 18 de janeiro de 2010

Poeta Alegre disposto a repetir candidatura presidencial.



Pergunta-se hoje no "Fórum" da TSF, cândidamente, se será ele o candidato ideal para bater Cavaco Silva (como se, por exemplo, uma máscara de Pai Natal fosse a indumentária ideal para se envergar na Semana Santa...).


A mim parece-me óbvio, há muito tempo, que Manuel Alegre será de facto o candidato ideal, sim, mas apenas para dividir e derrotar a Esquerda!


Creio também que a anunciada recandidatura deste conhecido Poeta e ex-Deputado do P. S., apoiada já entusiasticamente pelo Bloco de Esquerda, se destina sobretudo não a combater uma ainda hipotética recandidatura do actual Presidente da República, mas antes a afrontar, directamente, o Primeiro-Ministro José Sócrates e a actual liderança do Partido Socialista! E eu, eleitor de Esquerda que toda a vida sempre votei, coerentemente, contra Cavaco Silva e que, naturalmente e por maioria de razão, tencionava voltar a fazê-lo, decidi contudo que não o farei, daqui por um ano, se a única (ou a melhor) alternativa for votar numa personalidade tão desabilitada para ocupar a mais elevada "magistratura" do Estado como é, inquestionávelmente, Manuel Alegre!


Nesse caso, irei simplesmente abster-me, ou então votar NULO. E passo a explicar porquê.


Manuel Alegre diz-se um defensor acérrimo de variadas causas conotadas com o pensamento comum da Esquerda: Democracia, Liberdade, Solidariedade. Tudo muito louvável. Proclama-se igualmente um inabalável patriota e um amante de Portugal e da Língua Portuguesa, o que o pode tornar até politicamente mais abrangente, mas por outro lado também mais ambíguo, dado tratarem-se de causas habitualmente mais invocadas pelo discurso da Direita... Todavia, mesmo assim, nada ainda de especial a apontar. Manuel Alegre, porém, tem contra si um pensamento político pouco sólido e, sobretudo, um percurso partidário repleto de equívocos, desde uma fidelidade original inabalável a Mário Soares, mesmo nos seus momentos mais controversos (caso da famosa e nunca bem explicada "auto-suspensão" de Secretário-Geral do P. S., em 1980, por discordar do apoio oficial do seu Partido à recandidatura do então Presidente Ramalho Eanes), até à surpreendente candidatura presidencial contra este seu grande amigo e companheiro, há quatro anos - e a qual se saldou, aliás, pela derrota de ambos e pela tangencialíssima vitória do actual Presidente da República, que os dois pretendiam evitar! -, passando pela conhecida contestação aberta ao actual líder socialista, o qual defrontou mesmo, em eleições directas dentro do Partido (e das quais saíu, aliás, muito claramente derrotado).


Por outro lado, Manuel Alegre não possui, ao cabo de quase quatro décadas de intervenção cívica e pública no Portugal livre e democrático, um currículo mínimamente apresentável em termos de cargos executivos - descontando alguma fugaz passagem (?) por um dos Governos Provisórios dos tempos da Revolução (ou, eventualmente, pelo primeiro Governo socialista, de Mário Soares), que sinceramente não recordo e da qual, a ter existido, não terão ficado memórias significativas -, nem concomitantemente alguma vez saíu vencedor de uma disputa eleitoral nominativa (como, por exemplo, para Presidente de Câmara, ou mesmo de Junta de Freguesia), tendo-se apenas notabilizado como parlamentar e, mesmo aqui, muito mais pelos dotes retóricos, do que pela produção legislativa. Para quem pretende exercer o mais alto cargo executivo do Estado, afigura-se-me notóriamente desprovido de referências políticas e eleitorais valorativas.



Porquê, então, reincidir nesta aventura eleitoral, declaradamente votada a um segundo fracasso? Satisfação de imperativos de ordem meramente pessoal, é a primeira justificação que ocorre a um qualquer observador atento e lúcido. Manipulação fácil (de um certo excesso de vaidade e uma vontade de protagonismo a todo o custo), por parte de forças interessadas na criação de dificuldades ao Governo e ao Partido Socialista, é contudo mais uma hipótese, e nada abonatória, a considerar. Motivações estas que, em qualquer dos casos, não chegarão decerto para convencer os milhões de eleitores que escolheram NÃO votar nele há quatro anos e as quais, aparentemente, apenas servem os interesses estratégicos e mais ou menos sectários de quem, na cena partidária nacional, se empenha em afrontar mais ainda José Sócrates do que Cavaco Silva.


Não se questionando, lógicamente, a legitimidade de o Poeta se apresentar às próximas presidenciais, como candidato independente de Esquerda e com o apoio explícito de pelo menos um dos Partidos da actual Oposição (o B. E.), deverá no entanto questionar-se, sériamente, a coerência de uma tal tomada de posição política com a manifesta necessidade de um apoio oficial por parte de José Sócrates, para que a sua candidatura tenha um mínimo de hipóteses para, pelo menos, chegar à segunda volta, o que constitui claramente um factor de descredibilização desta candidatura junto da sua própria base eleitoral de apoio, fragilizando-a e permitindo assim ao seu oponente natural (o actual Presidente), bem como às forças que incondicionalmente o apoiam, dispor de trunfos preciosos numa contenda que se adivinha seja decidida por margens mínimas, a julgar pelos resultados invulgarmente tangenciais da vitória de Cavaco Silva há quatro anos.


Será então que Manuel Alegre não está consciente desta sua grave responsabilidade histórica? Ou, simplesmente, não está à altura de lidar com ela (mas, mesmo assim, quer ser o nosso Presidente?...)?



Pois, se me permite um conselho de observador experimentado da política portuguesa, veja-se um destes dias bem ao espelho e pergunte-se a si próprio, com honestidade, como pretende vir a ser recordado pelos vindouros, sobretudo pelos que partilham dos valores políticos com que afirma identificar-se. E só depois decida.


Mas decida rápido, que o tempo para as opções políticas de fundo é sempre demasiado curto para os que hesitam, ou vacilam!

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